sábado, 16 de abril de 2011

A Presidenta nos convoca a pensar o poder

                                                                  Escrito pela Dra EDLA EGGERT
No Brasil temos convivido desde o início do ano com uma nova experiência de poder. E uma palavra que, para a maior parte dos jornalistas têm incomodado: presidenta! Eles insistem em chamar a presidenta de presidente! Presidenta é o feminino de presidente! Simples como comer pão com manteiga e tomar café com leite. Por quê será que a sociedade em geral tem insistido com a palavra presidente? Tenho uma suspeita: é porque estamos inseridas numa lógica androcéntrica, ou seja, vivemos a vida onde o centro, o poder é dos homens. E qualquer mulher que ocupar esse lugar, pode até ficar nele, mas não o representa! O que esta no conjunto dessa constatação? No meu entender é a compreensão de que o feminino não é a referência. O feminino representa a fragilidade, a doçura, a doação, mas também o pecado, a luxúria, a confusão e a tentação. Essa compreensão vem de longe e a Religião é uma das instâncias responsáveis  pela permanencia dessa inculcação. Por isso não basta sair de casa para trabalhar e ganhar o “seu” dinheiro, não basta ser eleita prefeita, governadora ou mesmo presidenta. Não basta estudar é preciso muita atenção ao que estudamos, perguntar o porquê das coisas serem como são. Por quê ainda morrem tantas Mulheres em assassinatos realizados pelos namorados, maridos, amantes? Por quê apanham e acham que merecem ter apanhado? Por quê recebem 20 % a menos nos salarios ainda hoje? Por quê o Direito de ir e vir é sempre mais restrito às mulheres do que aos homens?
As mulheres, mas não todas as mulheres e uma boa parte dos homens têm buscado conscientemente fazer um movimento de mudança. A consciência de que fomos ensinadas para sermos submissas é necessária para que possamos mudar essa realidade. Ivone Gebara nossa teóloga atenta para as questões do feminino ensina que, o feminino em grande medida ainda é visto como mal e não somente pelo poder masculino, mas pelas próprias mulheres. E, nesse sentido que Margarete Rago afirma que “feminizar é preciso”. Ou seja, chamar de presidenta é feminizar o poder. É tornar mais viável a idéia de que as meninas podem sim pensar em ser Presidentas! Cientístas! E que os meninos podem sim ser homens que mostrem suas fragilidades, que aprendam a ser cuidadores e que sejam pais amorosos e firmes no propósito de serem parceiros conscientes da desigualdade entre meninas e meninos. Mulheres e homens devem estar atentos para a forma como os homens são construídos para a luta, a competição e a morte e de como as meninas são produzidas para a frivolidade do enfeite do corpo, do príncipe encantado como o salvador dos seus sonhos, e da sedução como a grande arma de poder, em detrimento da inteligencia e da autonomia de pensamento. 
O poder é bom, mas deve ser exercitado de formas cada vez mais coletivas e compartilhadas e não há receitas, há caminhos a serem trilhados. Creio que a sociedade vem se preparando mais para assumir as mudanças na busca por mais dignidade humana. Mesmo que no meio disso ainda ocorram grandes resistências e muito sofrimento, mas ninguém disse que seria um jardim de rosas…

sábado, 2 de abril de 2011

Jorge Aragão - Conselho

Guardar

    Guardar uma coisa não é escondê-la ou trancá-la. 
    Em cofre não se guarda coisa alguma.
    Em cofre perde-se a coisa à vista.
    Guardar uma coisa é olhá-la, fitá-la, mirá-la por admirá-la, 
    isto é,  iluminá-la ou ser por ela iluminado.
    Guardar uma coisa é vigiá-la, isto é, fazer vigília por ela,
    isto é, velar por ela, isto é, estar acordado por ela,
     isto é, estar por ela ou ser por ela.
    Por isso, melhor se guarda o vôo de um  pássaro.
    Do que de um pássaro sem vôos.
    Por isso se escreve, por isso se diz, por isso se publica, 
    por isso se declara e declama um poema:
    Para guardá-lo:
    Para que ele, por sua vez, guarde o que guarda:
    Guarde o que quer que guarda um poema:
    Por isso o lance do poema:
    Por guardar-se o que se quer guardar.  
                                                                                                                                 Antônio Cícero